CENSO 2022: Análise dos domicílios vagos. Acaso, ocaso, problema ou solução?
Leandro Begara, diretor de Inteligência de Mercado da Urban Systems, opina sobre o tema
Um dado do Censo 2022 divulgado pelo IBGE que vem gerando muita discussão e polêmica são os domicílios vagos. Em um cenário pós pandemia, onde muitas famílias mais carentes ainda não conseguiram reestabelecer patamares de renda razoáveis e as populações de rua das grandes cidades cresceu de forma muito preocupante, chama muita atenção a relevante elevação dos domicílios vagos.
Na pesquisa censitária de 2022 foram registrados mais de 11,4 milhões de domicílios nesta situação, o que corresponde a cerca de 13% do total de domicílios do país (90,7 milhões de domicílios no total). O crescimento desses domicílios foi de 87% durante o período intercensitário (de 2010, Censo anterior, a 2022), bastante superior ao crescimento de 34% no número total de domicílios.
Vale lembrar que, para o IBGE, domicílio vago configura-se como um imóvel atestadamente residencial com informação segura coletada pelo recenseador do IBGE de que tal unidade não contava com nenhum morador no momento da coleta. Incluem-se, portanto, imóveis disponíveis para uso, como casas e apartamentos que estivessem para alugar ou vender no período, e é justamente aqui que essa discussão precisa ganhar novos contornos.
Política social e mercado
Uma informação bastante difundida na mídia de que a cidade de São Paulo possui quase 589 mil domicílios vagos (o dobro do que possuía em 2010) e quase 50 mil moradores de rua¹, ou seja, 12 vezes mais imóveis vagos do que a população desabrigada, revela um problema que se repete – em menor escala – em quase todas as grandes cidades do país.
Guilherme Boulos (PSOL), pré-candidato à prefeitura de São Paulo e ativista de movimentos sociais pela moradia, tem trazido à pauta a necessidade de políticas habitacionais que viabilizem o aproveitamento desses imóveis vagos: “é urgente investir em políticas públicas como o aluguel social e a requalificação de imóveis no Centro Expandido para diminuir o déficit de habitação na capital”, afirma o político.
Certamente, uma cidade do porte da capital paulista, com o poderio econômico que possui e um número estrondoso de residências desocupadas, não pode se permitir ver uma população de rua como a que vemos pela cidade. Porém, é preciso ampliar o entendimento sobre esses imóveis, que possuem situações muito distintas de cunho jurídico, arquitetônico-construtivo e até mercadológico.
Como mencionado anteriormente, a estatística dos imóveis vagos inclui também imóveis em circulação, estimados em 50% do estoque vago na cidade de São Paulo. Apenas o aprofundamento da compreensão deste universo e dos motivos da vacância dos imóveis, poderá indicar as políticas públicas alternativas mais assertivas e eficientes para solucionar a problemática de como promover a reocupação deles.
Equilíbrio de mercado
Garantir o acesso à moradia – direito constitucional – é proporcionar a acessibilidade financeira à moradia, ou seja, garantir que a população tenha condições de arcar com os custos de moradia. Neste contexto, outra variável fundamental que precisa ser monitorada pelo poder público é a relação renda/aluguel.
A existência de imóveis vagos em circulação em um mercado é uma oferta importante na dinâmica de regulação de preços do mercado, agindo como um contrapeso à supervalorização imobiliária, para se manter os custos de moradia menos desproporcionais ao restante da economia local, mais condizentes com os fluxos econômicos que resultam na renda das famílias.
Essa equação, por certo bastante complexa sobretudo pela dificuldade de manutenção e gestão de um banco de dados bastante amplo e rico, deveria pautar outras importantes e acaloradas discussões sobre o futuro das cidades como a relação entre a possibilidade de novas áreas de expansão urbana X a necessidade de ampliação da verticalização, tema amplamente debatido nos Planos Diretores (como temos acompanhado em São Paulo), mas que é negligenciada pelos planejadores urbanos, políticos e sociedade.
O aumento da densidade em regiões mais centralizadas resulta no crescimento da oferta de imóveis, que pode proporcionar a redução (ou ao menos o congelamento) de valores de venda e aluguel. Essa medida, que favorece os incorporadores imobiliários e é muito criticada pelos movimentos de acesso à moradia, necessariamente deveria estar atrelada a políticas de subsídio ao aluguel de unidades desocupadas, tanto para sua requalificação construtiva e adequação arquitetônica às necessidades de uma moradia básica digna, quanto principalmente através do aluguel social.
Quebra de paradigmas
Este cenário que opõe de um lado os agentes produtores de imóveis e de outro os movimentos sociais em defesa da moradia é absolutamente contraditório. É preciso que ambos os lados sentem na mesma mesa e coloquem interesses em comum – criação de novas unidades habitacionais – como pauta prioritária para buscarem um entendimento que possa beneficiar a todos os envolvidos.
O assunto é extremamente delicado e polêmico, e não se pretende aqui apontar uma solução mágica que acomode os desejos e necessidades de todos. No entanto, estimular o debate e aprofundar o conhecimento é função obrigatória tanto do poder público quanto da iniciativa privada. As vezes o óbvio acaba sendo esquecido: buscar o bem comum faz bem para todos!
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Conteúdo elaborado por Leandro Begara, Diretor de Inteligência de Mercado da Urban Systems
Fontes:
¹Observatório Brasileiro de Políticas Públicas com a População em Situação de Rua (POLOS-UFMG), com dados do CadÚnico.
ROCHA
Excelente artigo para um assunto tão complicado e importante para toda a sociedade e o mercado imobiliário em particular.