Cidades Inteligentes e Sustentáveis: conceitos e perspectivas do planejamento urbano

Nesse painel, especialistas falam sobre os polos de inovação como centros de desenvolvimento econômico e impulsionadores de importantes transformações nas cidades

A sexta edição do Connected Smart Cities e Mobility Digital Xperience (CSCM-DX), realizado pela Necta e Urban Systems, aconteceu nos dias 08, 09 e 10 de setembro em formato inovador com mais de mais de 70 painéis, todos em ambiente digital, debatendo temas relevantes para o desenvolvimento das cidades. Os painéis que tiveram 300 palestrantes, gestores públicos, empresas e academia, gerou mais de 100 horas de conteúdo. A Urban Systems, sócia do Connected Smart Cities, esteve presente em diversos painéis com temas de cidades participativas, urbanismo sustentável e cidades prósperas. No dia 10 de setembro foi realizado o painel ‘Cidades Inteligentes e Sustentáveis: conceitos e perspectivas do planejamento urbano’.

Os especialistas convidados a exporem cases de sucesso e debater o futuro das cidades inteligentes e sustentáveis foram: Thomaz Assumpção CEO e Sócio Urban Systems e Connected Smart Cities; Evelyne Enoque Cruz, Arquiteta e Urbanista – Empresária – Diretoria Comercial Oikos Casa; Gabriel Mazzola Poli de Figueiredo, Pesquisador e Coordenador Técnico de Projetos Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da universidade de São Paulo (FAU-USP) e Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo (IPT), IPT Open Experience e CITI – Centro Internacional de Tecnologia e Inovação; além de Ana Paula Wickert, Secretária municipal de planejamento da Prefeitura Municipal de Passo Fundo.

A cidade também é a nossa casa

O painel começou com a apresentação de Evelyne Enoque Cruz, Arquiteta e Urbanista – Empresária – Diretoria Comercial Oikos Casa, empresa especializada na construção de empreendimentos inteligentes e sustentáveis, com o maior aproveitamento dos recursos naturais. “É muito importante para a cidade ter uma diversidade de tipos de moradias. Em cada cidade temos a região histórica, a região contemporânea e aquela complexa com diversos problemas a serem resolvidos. Temos trabalhado bastante em relação ao pertencimento das pessoas e moradias nas cidades, afinal, a cidade também é a nossa casa”, comentou.

Segundo Evelyne durante os últimos 20 anos em que a Oikos reformou e adaptou residências e áreas públicas, a empresa notou a grande quantidade de entulho gerada por essas reformas em Maceió (AL), onde fica a sede da empresa. “Temos também um carinho e responsabilidade social com a nossa cidade, portanto além de embelezarmos tantos locais e residências, sentimos a necessidade de pensar em uma destinação adequada para os entulhos gerados com a reforma”.

Foi dessa preocupação que surgiu, em 2010, a ideia de utilizar os refugos de azulejos das reformas em projetos de ressignificação urbana com o objetivo de unir os cidadãos, empresas e gestão pública no conceito: a cidade também é a nossa casa. Em 2016, a empresa começou a entregar amostras e refugos de azulejos em comunidades carentes gerando uma melhoria habitacional nessas regiões e consequentemente uma melhoria de qualidade de vida. “Eram casas sem piso, com problemas de drenagem, que conseguimos melhorar apenas com o que seria ‘lixo’ das reformas”, disse.

Outra questão abordada pelo projeto, foi a melhoria na acessibilidade na cidade de Maceió, que possui muitos elevados e é bastante híbrida em relação ao relevo. “Melhoramos e ressignificando as escadarias da cidade, promovendo uma melhoria em acabamento, melhoria local e ambiental. É incrível como promover uma melhoria nas escadarias estimula as pessoas a fazerem o mesmo. Após o nosso trabalho notamos que as pessoas que moravam ao redor passaram a se preocupar mais com o paisagismo, a pintar as fachadas das suas casas e a adaptação da ocupação dessas áreas para o lazer, culminando em locais com maior atuação do cidadão e diminuindo, inclusive os índices de violência”. A empresa também trabalhou com estudantes para a melhoria de ambientes públicos, tornando os espaços agradáveis, de forma a serem mais utilizados pelo cidadão. “Essas ações mostram que é possível fazer algo pequeno, de grande impacto positivo”.

Evelyne destacou também a ocupação ‘Escadaria todos pela cidade’, projeto já existente em Maceió coordenado pelo ‘Movimento Todos pela Cidade’ em que a Oikos contribuiu doando os azulejos para a melhoria na escadaria. O trabalho valorizou o entorno, melhorou a acessibilidade e resultou também na diminuição da violência urbana. “Esse espaço acabou se tornando um cartão postal da cidade. Adotamos essa escadaria e continuaremos zelando por ela não apenas o nosso contrato de 10 anos, mas por quanto tempo for preciso”.

 Impactos sistêmicos

O painel continuou com Gabriel Mazzola Poli de Figueiredo, Pesquisador e Coordenador Técnico de Projetos FAU-USP e IPT Open CITI que começou citando as experiências discutidas por meio da Carta Brasileira de Cidades Inteligentes, projeto do qual fez parte da elaboração, e os seus impactos sistêmicos. A Carta Brasileira para Cidades Inteligentes é uma iniciativa da Secretaria Nacional de Mobilidade e Desenvolvimento Regional e Urbano do Ministério do Desenvolvimento Regional (SMDRU/MDR). É desenvolvida no âmbito do Projeto ANDUS (Apoio à Agenda Nacional de Desenvolvimento Urbano Sustentável) e em colaboração com o Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) e com o Ministério das Comunicações (MCom).

“Foi um processo colaborativo de verdade, com muitas pessoas com especializações diferentes, atores diferentes, construindo diretrizes para políticas públicas para cidades inteligentes. Foi um processo valiosíssimo. Tive a oportunidade de coordenar com a colega Maria Teresa sobre como considerar os impactos sistêmicos em cidades inteligentes”. Figueiredo explicou que quando os desafios urbanos que se materializam na cidade são abordados, processos e atores cujas ações e efeitos se interpenetram e se afetam entre si. A esse conjunto de elementos relacionados entre si, se torna um sistema. “Na micro escala os impactos sistêmicos são mais fáceis de serem quantificados ou previstos, citando um exemplo simples: quando chove, minha casa alaga. É algo mais simples para sabermos os resultados”, disse.

Segundo Figueiredo, quando se passa para a macro escala, que os problemas urbanos pedem, envolvendo mais atores, aumenta a quantidade de elementos e interações que integram o sistema, o que torna mais complexo de se medir ou prever os impactos. “Citando o mesmo exemplo anterior, de uma casa que alaga durante as chuvas, é possível que outros elementos componham essa consequência, como a falta de drenagem do solo, pouca manutenção de um córrego entre outros”, comentou.

Ele destaca que para entender como trabalhar com os impactos sistêmicos é preciso entender a cidade como um sistema de alta complexibilidade, impossível de ser reduzido a uma abordagem simplista ou relações claras de causa e efeito. “Para projetar com essa complexidade é necessário navegar entre as diversas escalas de entendimento e complexidade, passando de uma visão mais abrangente, para um olhar detido e aprofundado sobre o tema conforme a necessidade. Para conseguirmos navegar entre essas escalas de complexidade, geramos uma série de considerações metodológicas que chamamos de ‘Projetando para a complexidade’ criando um diagrama para a criação dos projetos de acordo com a sua necessidade, considerando os impactos sistêmicos”.

Entre as metodologias utilizadas para diminuir os impactos sistêmicos, Figueiredo destacou a necessidade de se trabalhar em conjunto com o poder público, empresas privadas, cidadãos e academia. Sendo a participação da sociedade civil o maior desafio, já que para que seja efetiva é preciso que cidadãos de diversas faixas de renda, gêneros e idades diferentes participem, para que o projeto tenha seus impactos ainda mais reduzidos. Além disso Figueiredo lembrou a importância da tecnologia na obtenção de dados, além de pesquisas de diferentes metodologias para o desenvolvimento de um projeto que traga impactos para a cidade.

Conceitos e perspectivas do planejamento urbano

Thomaz Assumpção CEO e Sócio Urban Systems e Connected Smart Cities iniciou a sua apresentação explicando que a empresa entende que o tripé da sustentabilidade (econômica, social e ambiental) está apoiado no pilar econômico como indutor dos demais. “O projeto de sustentabilidade nasce, na nossa leitura, de um desenvolvimento econômico com a geração de emprego e renda. A lógica dessa sustentabilidade é entender a cidade na sua complexidade sistêmica e envolver todos os atores necessários para esse desenvolvimento. Existe uma grande dificuldade de entendimento de que a cidade é um organismo vivo repleto de interações pela classe política e pela classe empresarial é o desafio que vivemos o tempo todo, principalmente no que se refere a velocidade desse entendimento”, comentou.

Segundo Assumpção, para equilibrar esse sistema e a interação de todos os atores é preciso que exista uma aproximação entre os setores público e privado. Para ele, os pilares para o desenvolvimento de um projeto bem sucedido são: união entre o mercado/setor privado e poder público, aliado a um planejamento. “O Brasil é um país que não tem tradição em planejamento, os planejamentos são normalmente de ciclo curto e o mercado traz uma velocidade que não é atendida pelo setor público. É determinante que o setor privado e o setor público estejam em sintonia, o planejamento deve ser de ciclo longo, e não acompanhar o ciclo político de apenas quatro anos. Por exemplo, o ciclo de desenvolvimento de um bairro planejado é longo, demora 20 ou 30 anos para se consolidar. Então o poder público pode atender essa demanda para que o projeto tenha sustentabilidade econômica, de qualidade de vida e ambiental”.

A pandemia causada pelo novo Coronavírus (COVID-19) deixa alguns legados que irão impactar na gestão das cidades e no modo de vida das pessoas de acordo com Assumpção. “Estamos vivendo de forma acelerada a digitalização no mercado, que vende desde roupas a eletrodomésticos e apartamentos. Essa conectividade econômica, para nós, vem no sentido de olhar o Brasil como um todo, entendendo toda a sua diversidade, com as suas diferenças sociais, econômicas e ambientes completamente diferentes. A ligação econômica desses lugares se dá hoje pelo modal rodoviário e nesse novo tempo se dará, principalmente, pelo modal aéreo”.

Assumpção lembrou que a partir de agora, com essa mudança no perfil de consumo e com o andamento das privatizações, os aeroportos passarão a ser indutores de desenvolvimento para as cidades. “A concessão de aeroportos em diversos estados deverão trazer uma nova dinâmica nacional e internacional. E com certeza terá um impacto significativo no desenvolvimento não apenas nas cidades-sede desses aeroportos como em todas as suas conexões econômicas que essas cidades têm com o resto do Brasil e com o mundo. A responsabilidade do governo é ajudar a estruturação da malha aérea, já que temos diversas regiões com pouco acesso, como a região Centro-Oeste, utilizando a mesma lógica utilizada até hoje no modal rodoviário”, comentou.

Como exemplo, Assumpção citou o Aeroporto Internacional de Belo Horizonte-Confins – Tancredo Neves que teve a participação da Urban Systems no desenvolvimento do estudo para o projeto. Segundo ele, para esse aeroporto foi trabalhado o conceito de aerotrópole – que é uma cidade que se desenvolve ao redor do aeroporto, se tornando uma região metropolitana urbana com infraestrutura e economia centralizada no aeroporto, com todos os tipos de serviços e de indústrias. “Esse conceito faz com que o aeroporto se integre aos modais rodoviários que estão hoje ocupando cerca de 70% a 80% da malha de logística e transporte no Brasil. Essa nova lógica vai permitir que os aeroportos tenham um papel importante no desenvolvimento urbano de forma inteligente. Na medida que o aeroporto se dinamiza ele traz para cidade uma nova dinâmica de mercado imobiliário e de logística que, ao redor do aeroporto, se conecta com a cidade”.

Em seguida, Assumpção destacou também o trabalho da Urban Systems junto ao aeroporto de Viracopos, na região metropolitana de Campinas (SP) e seus impactos na região. “Essa dinâmica que antes era totalmente rodoviária, sendo Campinas um grande polo de desenvolvimento do de São Paulo, cercada por rodovias importantes, com a ampliação da atuação do aeroporto passa a integrar essa malha e dar vazão a diversos setores de diversas cadeias produtivas daquela região”.

Parque da Gare

A arquiteta e urbanista Ana Paula Wickert, Secretária municipal de planejamento da Prefeitura Municipal de Passo Fundo (RS), trouxe para o painel um case de sucesso em gestão de parques: o Parque da Gare, implementado em 2016 com o auxílio do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). “Passo Fundo é uma cidade média, com cerca de 203 mil habitantes e o Parque foi criado em uma antiga área ferroviária, tornando essa área de 55 mil m² equipada com lazer, esporte, meio ambiente, vivaz com a gastronomia, realização de feiras e eventos”, comentou.

Ana Paula explicou que junto ao projeto de desenvolvimento da área e atividades para o Parque foi desenvolvido paralelamente um projeto de gestão e manutenção. “É importantíssimo pensar o espaço, a sua ocupação, manutenção e como gerar financeiramente a sustentabilidade desse local. Atualmente o Parque acabou se tornando auto sustentável”.

Além dos equipamentos comuns a outros parques como áreas verdes, nascentes e lagos, espaços para caminhada, playground, anfiteatro e locais destinados a prática de esportes, o Parque da Gare traz três espaços distintos voltados à geração de renda para auxiliar na manutenção e sustentabilidade do local: Feira do Produtor Familiar, Prisma Estação Cultural e Complexo Gastronômico operado pela iniciativa privada. “Pensamos que o Parque não deveria ser gerido apenas pelo poder público, por isso criamos parcerias com o setor privado e associações para a realização de eventos, por exemplo, sem necessariamente privatizar o espaço ou criar um espaço segregador. A diversidade de usos gera empregos, gera renda e torna o espaço atrativo e seguro para o público”.

A Feira do Produtor, resultado da parceria com uma associação de produtores rurais de Passo Fundo, é realizada três vezes por semana, tem 62 stands, 54 famílias produtoras, vendendo mais de 500 produtos diferentes, com, em média, 4.200 consumidores por semana, movimentando a economia local. Próximo à Feira, foi criado o centro gastronômico chamado Gare Estação Gastronômica, que possui 11 stands e uma média de 2 mil consumidores por semana. “Essa sugestão de uso foi dada pela própria população em uma audiência pública. Então utilizamos o prédio tombado, licitamos esse prédio com diversas regras e implementamos um modelo de negócio aberto em que a pessoa pode utilizar mesmo sem consumir e a empresa vencedora é responsável pela segurança do local”.

O próximo equipamento público que será inaugurado em breve segundo Ana Paula é o Prisma Espaço Geek, vinculado à Secretaria da Educação. O espaço será implementado com recursos públicos. “Com o espaço pronto faremos parcerias com a iniciativa privada, a ideia é que sejam empresas de ponta na área de tecnologia, para a gestão e manutenção do espaço”.

O painel aconteceu ao vivo e contou com apresentações e debates entre os participantes, clique aqui para acessar o painel.

Conteúdo elaborado pela, Redação Urban Systems

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